segunda-feira, 18 de novembro de 2013

Alegoria do Fruto

Pr. Anísio Renato de Andrade


Uma reflexão sobre aparência, substância e essência do cristianismo.
Podemos comparar o cristianismo que professamos, praticamos e cremos a um fruto, composto de casca, polpa e semente. Estes três elementos são importantes, mas não têm todos o mesmo valor.
A casca dá boa aparência ao fruto e serve como invólucro protetor contra as pragas e intempéries do ambiente. A polpa é a parte de maior utilidade imediata, sendo também a mais saborosa e nutritiva. Entretanto, a semente é o elemento mais precioso porque tem a função de perpetuar a espécie, possibilitando a produção de inúmeros frutos no futuro.

CASCA – APARÊNCIA RELIGIOSA

O cristianismo também tem a sua casca, que podemos sintetizar pelo uso dos verbos ter e fazer, incluindo nossa liturgia, por mais maravilhosa que seja. Todo o nosso aparato material, inclusive artístico e tecnológico é casca, ou seja, tudo aquilo que pode ser visto pelos homens, podendo funcionar como atrativo, como acontece com a embalagem de um produto. Qualquer religião pode ter templos magníficos e realizar eventos extraordinários. Entretanto, o cristianismo é muito mais do que isso. Se a nossa vida cristã se resume ao que fazemos no templo, estamos enganando a nós mesmos. Não me refiro ao lado espiritual do culto, mas à aparência dos atos em si. Os fariseus eram bons de casca. Sua aparência era a melhor possível, mas Jesus chegou a compará-los aos sepulcros caiados: bonitos por fora e podres por dentro (Mt.23.25-27).
A casca é uma religiosidade superficial. Ela pode não ser ruim, desde que não seja a única coisa que temos, como acontece com aqueles frutos que parecem tão bonitos, mas já foram devorados internamente por algum verme. O pecado pode nos consumir por dentro, apesar do nosso bom aspecto exterior (Sal.32.3).
A religiosidade, com seus usos e costumes, pode garantir boa aparência, mas de nada servirá se faltar a essência. Será como vestir uma roupa nova, cara e deslumbrante em um defunto.
Jesus alertou os discípulos para que não se enganassem com esse nível religioso:
“Guardai-vos de fazer as vossas boas obras diante dos homens, para serdes vistos por eles; de outra sorte não tereis recompensa junto de vosso Pai, que está nos céus. Quando, pois, deres esmola, não faças tocar trombeta diante de ti, como fazem os hipócritas nas sinagogas e nas ruas, para serem glorificados pelos homens. Em verdade vos digo que já receberam a sua recompensa...” (Mt.6.1-21). O mesmo alerta foi dado em relação às orações públicas e aos jejuns ostensivos.
Não confunda atividade e religiosidade com espiritualidade. São coisas bem diferentes. A religiosidade produz um sentimento de dever cumprido e uma satisfação que sossega a consciência humana sem ter necessariamente agradado o coração de Deus. Não adianta trabalhar para Deus sem conhecê-lo.

POLPA – MODO DE VIDA

Abaixo da casca está a polpa do fruto. Vamos representá-la pelo uso do verbo obedecer. É a substância que vai além dos rituais e abrange nossa vida, nosso comportamento, principalmente fora do templo e das reuniões cristãs.
Na parábola do bom samaritano foram citados o levita e o sacerdote que poderiam estar em dia com seus deveres no templo, mas falharam fora dele. O evangelho não pode ficar preso nos templos, mas precisa sair pelas ruas e entrar nas casas através de pessoas que vivem o que Jesus mandou. Aqui estão as questões éticas da nossa vida e o testemunho cristão, se obedecemos aos mandamentos de Deus ou não, se fazemos o bem ao próximo ou não. Contudo, se fizermos boas obras com o intuito de aparecer, voltamos ao nível da casca.
Em geral, a polpa é a parte mais nutritiva do fruto. Nosso modo de viver será muito mais útil aos que nos rodeiam do que a realização de rituais. Se cumprimos ritos religiosos e temos bom comportamento estamos plenamente realizados? Não. O cristianismo é muito mais do que isso. Muitos ímpios também têm boa índole e bom comportamento, mas isto não os livrará do inferno. Muitos fazem obras de caridade, mas não serão salvos por elas.
O jovem rico mencionado em Mateus 19.16 era obediente aos mandamentos e, certamente, cumpridor de suas obrigações religiosas, mas Jesus disse: “Uma coisa ainda te falta”. Ele estava acima do padrão dos fariseus, mas ainda não havia alcançado o padrão de Cristo. Além da casca e da polpa está a semente. Além da aparência e da substância está a essência, que podemos resumir pelo uso do verbo ser. É possível ter, falar, fazer e até obedecer parcialmente sem ser. Isto nos faz lembrar as palavras de Jesus: “Muitos me dirão naquele dia: Senhor, Senhor, não profetizamos nós em teu nome? e em teu nome não expulsamos demônios? e em teu nome não fizemos muitos milagres? Então lhes direi claramente: Nunca vos conheci; apartai-vos de mim, vós que praticais a iniquidade” (Mt.7.22-23).

SEMENTE – O QUE ESTÁ NO CORAÇÃO

A semente é o que está em nossos corações. Isto vai muito além da prática religiosa, dos costumes, das tradições e até mesmo do bom comportamento, pois abrange as motivações, pensamentos, intenções e o compromisso com Deus. Este é o cristianismo no íntimo, onde somente Deus vê. Não estamos desvalorizando os atos litúrgicos nem a ética, mas dizendo que a relação com Deus é algo mais profundo do que tudo isso. O jovem rico cumpria os mandamentos, mas não tinha relacionamento com Deus. Era semelhante a um filho obediente que vive longe do pai. O que havia em seu coração? O amor ao dinheiro.
Que tipo de fruto é o cristianismo que eu vivo? Apenas casca? Tem substância? Tem essência? A prova dirá. As tribulações rompem a nossa casca e revelam quem somos. Em algum momento, a casca precisa ser rompida para que a semente se manifeste. Foi o que aconteceu com Jó. Sua “casca” foi arrancada e sobrou somente a essência. Depois de perder tudo, ele se prostrou e adorou, demonstrando profundo compromisso com Deus.
Podemos viver um tempo em que nossos cultos públicos serão impedidos. Isto acontece em países onde o cristianismo é proibido. Então, só resta o que é íntimo. O profeta Daniel, no exílio babilônico, viu-se distante dos rituais religiosos judaicos, mas teve a oportunidade para manifestar a essência da sua fé.
Atos religiosos podem ser realizados mecanicamente. Bom comportamento pode ser resultado da educação, mas existe algo mais profundo que é a vida de Deus em nós.
As palavras de Jesus aos fariseus demonstram que ele estava em busca da semente em seus corações:
“Ai de vós, escribas e fariseus, hipócritas! porque dais o dízimo da hortelã, do endro e do cominho, e tendes omitido o que há de mais importante na lei, a saber, a justiça, a misericórdia e a fé; estas coisas, porém, devíeis fazer, sem omitir aquelas” (Mt.23.23).
Os apóstolos de Cristo alcançaram um nível espiritual muito acima dos fariseus e do jovem rico. Tornaram-se exemplos de pessoas que foram quebradas e demonstraram ter a boa semente em seus corações. Provaram isto porque foram fiéis, não em um contexto de prosperidade material, mas em meio às perseguições e perdas, mantendo o compromisso com Deus até a morte.
Nossas reações diante das situações difíceis da vida, das ofensas e das perseguições revelam o que existe em nosso íntimo. Em momentos assim, muitos religiosos se desviam, mas os verdadeiros cristãos ficam firmes porque sua semente é autêntica. A semente é a parte mais forte do fruto, exatamente para resistir ao mau tempo e garantir que, depois do inverno, uma nova vida comece.
Muitas sementes são desvalorizadas, sendo jogadas ao lixo, juntamente com a casca. Da mesma forma, corremos o risco de desvalorizar o mais importante na vida cristã: a intimidade com Deus. Precisamos conhecê-lo e ter experiências reais com ele, pois elas nos manterão de pé quando tudo estiver caindo à nossa volta. Precisamos buscá-lo intensamente e conhecer sua palavra profundamente. Menos do que isso é viver apenas no nível superficial da casca.
Tudo no fruto é importante, mas precisamos investir mais na intimidade com Deus, combatendo os pecados do coração e não apenas na aparência. Deste modo, seremos frutos aprazíveis a Deus. As lutas não nos destruirão se, no profundo do nosso ser, houver a fé e o amor, como sementes divinas e preciosas. Esta é a boa e verdadeira espiritualidade.
A casca é pública. A polpa é particular. A semente é íntima, secreta.
“Teu Pai, que vê em secreto, te recompensará” (Mt.6.6).

Pr. Anísio Renato de Andrade

sexta-feira, 15 de novembro de 2013

As Guerras e Vitórias do Cristão

Pr. Anísio Renato de Andrade



Quem não tem luta é soldado morto.

Os israelitas foram escravos no Egito até que Deus os libertou por intermédio de Moisés. Israel venceu Faraó sem lutar. A vitória foi conquistada pelo sangue do cordeiro (Ex.12). Entretanto, quando chegaram a Canaã, encontraram os gigantes, contra os quais deveriam pelejar (Num.13).
Era uma situação nova, diferente, e com aspectos surpreendentes. Imagino que eles podem ter dito:
“Nosso problema era com os egípcios. Agora, precisamos lutar contra os cananeus. Eu não esperava por isso”.
Quando começamos a buscar o propósito de Deus, encontramos novos problemas, até maiores do que os antigos. São novos desafios. Algumas situações são resolvidas por Deus, mas outras são de nossa responsabilidade e ele nos ajudará.
Isso acontece também no plano natural. Quando éramos recém-nascidos, nossos pais resolviam tudo para nós, mas, na medida em que fomos crescendo, precisamos aprender a resolver problemas, e eles são cada vez maiores. Isso faz parte do processo de desenvolvimento e amadurecimento.
Os hebreus ficaram decepcionados com Deus e com Moisés. Ao verem os cananeus, sentiram “saudade” dos egípcios.
“Então toda a congregação levantou a voz e gritou; e o povo chorou naquela noite. E todos os filhos de Israel murmuraram contra Moisés e Arão; e toda a congregação lhes disse: Antes tivéssemos morrido na terra do Egito, ou tivéssemos morrido neste deserto” (Nm.14.1-2).
Muitos cristãos também se decepcionam porque alimentaram uma expectativa errada em relação ao cristianismo. Esperavam uma vida tranquila, mas encontraram muitos gigantes pela frente. Nesses momentos, nossa fé é desafiada. Precisamos continuar crendo que, se os inimigos são grandes, a vitória será ainda maior. Temos condições de enfrentá-los e vencê-los pelo poder de Deus, em nome de Jesus!!!

SOMOS SOLDADOS

O propósito do Senhor para Israel era transformar escravos em guerreiros. Eles não se tornariam turistas.
Após a conversão, podem surgir muitas lutas na vida do cristão. Isto é normal. Afinal de contas, somos soldados.
“Sofre comigo como bom soldado de Cristo Jesus. Nenhum soldado em serviço se embaraça com negócios desta vida, a fim de agradar àquele que o alistou para a guerra” (2Tm.2.2-3).
Somos guerreiros, mas queremos viver em paz. É um paradoxo. Fazemos parte do exército de Deus e nenhum cristão está dispensado deste serviço militar.
Podemos ter paz interior, paz com Deus, com o próximo etc, mas não com Satanás. Estamos em constante guerra espiritual. O escravo tem muitos problemas e dificuldades. O soldado tem outros tipos de problemas. Alguém pode perguntar qual é, afinal, a vantagem de ter se convertido. Você continua na guerra, mas agora está do lado certo.
Em nossas orações, estamos pedindo vitória ou cancelamento da guerra? Devemos pedir armas e munição: conhecimento, sabedoria, prudência etc. Devemos usar as armas que Deus já nos deu. Entram nesse contexto as virtudes e valores reunidos na “armadura de Deus” citada por Paulo (Ef.6.10-18).
O livro de Josué narra as batalhas e conquistas de Israel. Depois da peregrinação no deserto, decidiram assumir seu papel de guerreiros, sabendo que a luta era inevitável.
O livro de Juízes mostra um período conturbado em que os inimigos oprimiram Israel e Deus levantou líderes para libertá-los repetidas vezes. Nesse tempo, os israelitas estavam divididos, chegando, inclusive a lutarem contra os próprios irmãos.

ERROS DE GUERRA

Em todos esses cenários, é importante observarmos os “erros de guerra”. Somos falíveis e erramos muitas vezes, mas errar na guerra pode ser fatal. Alguns exemplos seriam: desertar, ir para a batalha desarmado, não saber usar as armas, enganar-se na identificação do inimigo ou usar estratégia ineficaz.
Entre as ocorrências bíblicas, podemos citar:
Js.7– Acã cobiçou os bens do inimigo, os quais Deus havia proibido. Isso foi causa de derrota para Israel.
Js.9– Josué foi enganado pelos gibeonitas, que fingiram ser amigos, e fez aliança com eles.
Jz.12 – Os gileaditas combateram os efraimitas, embora todos eles pertencessem à nação israelita.
Jz.13 – Sansão dormiu com a inimiga Dalila. Intimidade com o inimigo é algo inadmissível. Entram aqui os pecados sexuais.
Os erros de guerra acarretam muitas derrotas que poderiam ser evitadas.

IDENTIFIQUE SEU INIMIGO

Em qualquer guerra, é fundamental que as partes combatentes sejam bem identificadas. Quando se diz que determinado país está em guerra, a pergunta imediata é: “contra quem”? Nos casos de guerra civil, o inimigo é interno. Os cidadãos do mesmo país matam-se uns aos outros. Será que isso acontece entre irmãos?
Identifique seu inimigo! Está escrito que “não é contra carne e sangue que temos que lutar, mas sim contra os principados, contra as potestades, contra os príncipes das trevas deste século, contra as hostes espirituais da maldade nas regiões celestiais.” (Ef.6.12).
Seu inimigo não é a sua sogra, marido, esposa, vizinho, colega de trabalho ou de escola.
Quando os inimigos do homem são seus próprios familiares, conforme está escrito (Mt.10.36), verifica-se uma distorção causada pelo pecado, pois este não é o propósito de Deus para a família.
Existe uma realidade espiritual por trás de muitos problemas e conflitos naturais. Satanás e seus demônios estão agindo, embora não possamos generalizar e espiritualizar tudo. Quantas vezes deixamos de lutar contra os poderes das trevas e investimos contra os seres humanos a quem deveríamos amar?
Podemos denunciar heresias para que não avancem em nosso meio, mas não fomos chamados para lutar contra os irmãos nem para combater igrejas ou denominações cristãs.
Quando os gileaditas combatiam seus irmãos efraimitas, faziam um teste. Pediam que o suspeito falasse a palavra “sibolete” , palavra hebraica que significa "rio". Se ele, por uma dificuldade de pronúncia, dissesse “chibolete”, ficaria provado que era um efraimita. Nesse caso, era imediatamente executado (Jz.12).
Pequenas diferenças entre os irmãos não devem ser suficientes para que nos tornemos adversários. Enquanto lutamos uns contra os outros, o verdadeiro inimigo, que é Satanás, prospera em muitos dos seus intentos.

LUTAS DESNECESSÁRIAS

Algumas vezes, entramos em guerras que não são nossas. Isso pode ser correto e necessário, como fez Abraão para libertar seu sobrinho Ló (Gn.14). Entretanto, é preciso discernimento para que não vivamos assumindo problemas alheios. Quando Ló precisou sair de Sodoma, Abraão não foi lá buscá-lo.
O pecado nos coloca em lutas que não faziam parte do propósito de Deus para nós. São guerras desnecessárias. Por exemplo, o sexo fora do casamento, a prostituição e o adultério, podem trazer doenças venéreas, gravidez indesejada, divórcio, pensão alimentícia e outras situações que poderiam ser evitadas. Algumas delas, depois de estabelecidas, não podem ser eliminadas.
NOSSAS ARMAS
Em nossas pelejas, podemos estar utilizando armas erradas. Se alguém nos maldiz, maldizemos? Se alguém nos calunia, caluniamos? Não podemos usar as armas do inimigo (Satanás), pois ele as domina muito melhor do que nós.
Paulo disse:
"Somos injuriados, e bendizemos; somos perseguidos, e o suportamos" (ICo.4.12b).
"Não te deixes vencer do mal, mas vence o mal com o bem" (Rm.12.21).
"As armas da nossa milícia não são carnais, mas poderosas em Deus, para demolição de fortalezas” (2Co.10.4).
Uma das nossas armas é a palavra de Deus. Foi com ela que Cristo venceu Satanás no deserto (Mt.4). Precisamos conhecer a bíblia para podermos utilizá-la com êxito. Quem não sabe usar uma arma, pode ferir-se com ela, ou ferir outras pessoas indevidamente.
Outra arma que temos a oração. Diante de qualquer luta, nossa primeira providência deve ser orar.
Que Deus nos ajude a lutar corretamente, sabendo que, em Cristo, nós já somos mais do que vencedores.

Pr. Anísio Renato de Andrade

quinta-feira, 14 de novembro de 2013

A FIGUEIRA INFRUTÍFERA -

Pr. Anísio Renato de Andrade


“Certo homem tinha uma figueira plantada na sua vinha; e indo procurar fruto nela, não o achou. Disse então ao viticultor: Eis que há três anos venho procurar fruto nesta figueira, e não o acho; corta-a; para que ocupa ela ainda a terra inutilmente? Respondeu-lhe ele: Senhor, deixa-a este ano ainda, até que eu cave em derredor, e lhe coloque esterco; e se no futuro der fruto, bem; mas, se não, corta-la-ás” (Lc.13.6-9).
Esta parábola começa com algo estranho: “uma figueira no meio da vinha”. Vinha é uma plantação de videiras. Por quê haveria ali uma figueira? Por uma concessão e propósito do proprietário.
Neste texto, como em outras passagens bíblicas, o ser humano é comparado a uma árvore.
O dono da vinha é Deus, o Pai. Se estamos no meio da vinha do Senhor, é apenas por sua graça e amor. Não temos a natureza e a qualidade correspondentes à santidade divina, mas vivemos pela misericórdia. Nunca deveríamos fazer exigências diante de Deus com base em direitos ou méritos. Reconheçamos a graça e sejamos gratos.
Todo cultivo representa investimento e tem um propósito. Nesse caso, o objetivo era a frutificação. O Senhor tem expectativas ao nosso respeito. Ele fez grande investimento em nossas vidas e o maior deles foi o sangue precioso derramado no Calvário. Além disso, ele nos deu o seu Santo Espírito e dons e ministérios.
Os frutos são resultados esperados. O problema é que a expectativa de Deus é, geralmente, diferente da nossa, assim como pais e filhos têm, quase sempre, diferentes desejos e planos. Os pais se preocupam com a saúde, o caráter, a formação educacional e profissional do filho, mas ele, sendo uma criança, talvez queira apenas um brinquedo novo. O que temos desejado, planejado e realizado? Quais têm sido nossas prioridades?
O texto fala sobre um tempo de avaliação. Quando chegamos ao final de cada ano, fazemos avaliações. Aqueles a quem Jesus se dirigia tinham a tendência de avaliar os outros (Lc.13.1-5), mas precisamos fazer o auto-exame (ICo.11.28). Quando o fazemos, é possível que nos gloriemos de muitos resultados que talvez não sejam os que Deus deseja.
Uma figueira pode ser alta, forte, bonita, com folhagem exuberante e até flores, mas, se não tiver fruto, não estará cumprindo sua missão. Todas essas características são boas, porém insuficientes. O bom não substitui o melhor. Afinal de contas, para quê servimos nós? Para produzirmos sombra? Somos enfeites? Nossa madeira terá alguma utilidade? Nossas folhas servirão como vestimentas? (Gn.3.7). O que o Senhor procura em nós é o fruto. Muitos objetos podem produzir sombra, mas a figueira existe para produzir figos.
Podemos ter alcançado tantas coisas nesta vida: dinheiro, bens, posições, cargos, títulos e, ainda assim, não termos produzido fruto.
Quando Jesus voltar, muitos apresentarão um relatório diante dele, dizendo: Senhor, em teu nome nós profetizamos, expulsamos demônios, fizemos sinais e maravilhas. Então, ele lhes dirá: Apartai-vos de mim, vós que praticais a iniquidade (Mt.7.22-23).
Desta passagem bíblica, entendemos que o exercício dos dons espirituais não é fruto diante de Deus. Tanto é assim que, nos escritos de Paulo, os dons (ICo.12) estão separados do fruto do Espírito (Gal.5.22). Podemos trabalhar muito e não produzir o que Deus espera de nós, assim como Marta trabalhava, mas não agradava ao Mestre (Lc.10.40).
O que seria então o fruto? O antônimo da iniquidade. Não é apenas evitar o pecado, mas fazer algo positivo em seu lugar. “Cessai de fazer o mal e aprendei a fazer o bem...” (Is.1.16-17). O fruto do Espírito é o contrário das obras da carne (Gal.5.16-22). Podemos resumi-lo em duas palavras: santificação e amor. A santificação combate o pecado. O amor não nos deixa inativos, mas nos faz produzir o bem.
Outra forma de definir o fruto é “aquilo que fazemos de bom por outras pessoas”. O que eu fizer por mim mesmo não vale como fruto. Como disse Lutero, “nenhuma árvore produz fruto para si mesma”. Podemos comer e beber do melhor todos os dias, mas nada disso supera o valor de um copo d’água dado ao sedento (Mt.10.42).
Naquela parábola, o dono da vinha veio procurar o fruto e, não o achando, ficou decepcionado. A figueira é um símbolo de Israel e representava diretamente aqueles judeus aos quais Jesus contou a parábola. Em última instância, ela nos representa também, pois Deus tem a mesma expectativa a nosso respeito.
Não tendo achado o fruto almejado, o Senhor mandou cortar a figueira. Temos neste ponto a manifestação da justiça divina. Em seguida, ocorre a intercessão. O viticultor parece representar o Senhor Jesus, que é nosso advogado diante do Pai (IJo.2.1). Personificando o amor divino, ele clama: “Senhor, deixa-a mais este ano”. Então, a execução judicial foi adiada.
Cada dia das nossas vidas é uma nova oportunidade. Se estamos ainda nesta terra, é porque não fomos cortados. Ainda podemos frutificar.
O viticultor se prontificou a cuidar da figueira, cavando em volta e adubando. O Senhor ainda se propõe a investir mais em nós. O processo pode ser difícil. Cavar em volta pode ser um procedimento incômodo que vêm romper a dureza do solo, expor o que está oculto, retirar as pedras e nos fazer mais receptivos à água que representa a Palavra de Deus. O adubo pode não ser agradável, não cheira bem, mas é necessário. Precisamos aprender também com as coisas ruins que nos sobrevêm.
Que Deus nos ajude a reconhecer tais processos em nossas vidas, de tal maneira que não venhamos a rejeitar a divina intervenção.
A figueira ganhou tempo, mas uma nova avaliação já está marcada. O juízo final se aproxima. Precisamos frutificar enquanto Deus nos permite.
Jesus disse àqueles homens: “Se não vos arrependerdes, todos de igual modo perecereis” (Lc.13.5). O arrependimento é o primeiro fruto que o Senhor procura. Este foi o tema da pregação de João Batista e também do Senhor Jesus ao iniciar o seu ministério.
Arrependimento é conscientização, desejo, decisão e mudança. Que Deus nos ajude para que possamos produzir os frutos que ele procura em nós.

Pr. Anísio Renato de Andrade
Bacharel em Teologia

quarta-feira, 13 de novembro de 2013

PROSPERIDADE -
Onde termina a doutrina bíblica
começa a heresia.
Anísio Renato de Andrade
 
Todos querem prosperar. É natural e óbvio que desejemos o sucesso dos nossos planos. Contudo, precisamos estar conscientes de que os planos de Deus estão acima dos nossos. Os propósitos divinos serão concretizados, quer queiramos ou não. Por isso, alguns dos nossos planos ou pedidos podem não se cumprir, por serem contrários aos objetivos do Senhor (Mc.10.35-40; II Cor.12.7-9). O que torna a questão ainda mais digna de ponderação é o fato de que os propósitos de Deus nem sempre são conhecidos ou, pelo menos, não são de conhecimento público.
Pode então acontecer de alguns cristãos estabelecerem alvos e viverem lutando por alcançá-los, esperando uma ajuda divina, depositando sua fé e sua esperança em algo que pode não acontecer. Prosperidade é um conceito bíblico. Porém, precisamos considerar os limites do conceito.
Se você recebeu uma promessa de Deus, então caminhe na direção desse propósito, pois sua realização está garantida. Pode depositar sua fé sobre a palavra de Deus, pois esse investimento é seguro.
Se você simplesmente deseja algo correto e legítimo, então você pode orar, jejuar e trabalhar pela realização. O seu propósito pode ser bom e Deus pode abençoá-lo com o êxito. Entretanto, seu propósito pode ser mau, mesmo parecendo bom, e então Deus não permitirá que você prospere nesse empreendimento. Um filho pode pedir que pai lhe permita sair sozinho para brincar na rua. Então, suponhamos que o pai não permita. A criança pode ficar revoltada, mas o pai sabe o que é melhor e mais seguro para o filho. Da mesma forma, Deus vê o que nós não vemos. Ele vê o futuro de um negócio, de um casamento, de um emprego, de uma amizade, de uma viagem, etc. Assim, ele impede que alguns projetos se concretizem pois sabe que aquilo não
seria benéfico. Podemos ficar então com a impressão de não termos prosperado. Contudo, a verdadeira prosperidade não consiste em conseguirmos tudo o que queremos, mas em estar onde Deus quer que estejamos, fazendo e conquistando tudo o que ele tem para nós.
Quando Ló se separou de Abraão, escolheu as campinas do Jordão. Quem assistisse aquela cena, pensaria que Ló tinha ficado com a melhor parte, a melhor terra e, portanto, seria mais próspero. Sabemos o que lhe aconteceu depois e como sua família foi destruída quando Deus fez chover fogo e enxofre sobre Sodoma e Gomorra. Abraão, porém, que foi para lugar inóspito, teve sua descendência preservada e prosperou.
A verdadeira prosperidade faz parte dos desígnios de Deus para nós. Contudo, ela não é sinônimo de riqueza. Também não significa que vamos vencer sempre, ganhar sempre e conseguir tudo o que queremos com a máxima urgência. Os caminhos de Deus para nós passam por lugares perigosos e às vezes desconfortáveis, mas o seu fim é o mais próspero possível. Certamente passaremos pelo vale da sombra da morte. Andaremos por caminhos apertados e entraremos por portas estreitas, mas chegaremos a um lugar aprazível. Para alguns, esse estado de plenitude não se dará nesta vida.
Não quero criar uma idéia de comodismo nem de conformismo. Precisamos sempre lutar para crescer. O que não podemos é ter em mente um interpretação errada das Escrituras e do evangelho, como se a mensagem do Senhor Jesus tivesse como objetivo o nosso enriquecimento material e a satisfação dos nossos caprichos.
Podemos ter pedidos negados. Podemos sofrer. Podemos passar por muitas tribulações e aflições, conforme o próprio Jesus nos advertiu (João 16.33). Essa idéia de um "cristianismo 5 estrelas", onde não existem adversidades, é uma perigosa heresia.
O cristão não precisa ser rico. Se for, ótimo. Mas, sendo ou não, o mais importante é que, onde estiver, ele seja justo, íntegro, amável e amigo. Isso jamais pode significar o engradecimento pessoal. Vejamos o exemplo de Jesus. Sendo o máximo em todos os aspectos de caráter, ele se abaixou e lavou os pés dos discípulos.


PROSPERIDADE NÃO É SINÔNIMO DE RIQUEZA MATERIAL

Anísio Renato de Andrade

Em tempos de crise, o atendimento às necessidades materiais se torna um assunto prioritário. Afinal, queremos garantir nosso sustento e sobrevivência. Queremos também conforto e todo tipo de satisfação pessoal. Queremos ter um ótimo emprego. Mas, que tal termos nosso próprio negócio? Melhor ainda. Tudo isso é permitido. Não existe nenhum pecado em todos esses desejos, desde que estejamos dispostos a trilhar caminhos direitos para alcançarmos o que desejamos. Entretanto, muitos têm anunciado o evangelho como se este fosse um meio para se alcançar riqueza. Chegam a dizer que todo cristão deve ser rico e, se for pobre, é porque está em pecado ou sob maldição.
Vejo essa "teologia da prosperidade" como fruto da mentalidade capitalista que tem dominado o mundo, entrando inclusive em muitas igrejas. Muitos pregadores apresentam esse "evangelho" através de uma linha de raciocínio aparentemente lógica. Afirmam que, se Deus é rei, então seus filhos devem ter o que de melhor existe no mundo. Se ele é o dono do ouro e da prata (Ag.2.8), então os cristãos também devem ter muito ouro e muita prata. Segundo essa falsa tese, o supremo poder de Deus estaria a nosso serviço para nos dar tudo o que desejamos. Mas... quem é o Senhor? Nós? Não!
Precisamos perguntar como Paulo: "Senhor, que queres que eu faça?" (At.9.6). Temos uma lista de pedidos para Deus. Algumas pessoas tem uma lista de ordens, chegando a "determinar" que Deus faça uma série de coisas. Quem somos nós para determinar alguma coisa para Deus? Será que já cumprimos tudo o que ele determinou que fizéssemos? Imagine um servo que, ao invés de fazer o serviço, está dando ordens para o dono da casa. Podemos e devemos apresentar nossos pedidos diante do Senhor, mas nunca ordens nem determinações. Isso seria um atrevimento, uma falta de respeito diante de Deus.
Se o evangelho for garantia de riqueza material, então sabemos que Jesus não conheceu esse evangelho. Ele não tinha nem lugar de reclinar a cabeça (Mt.8.20). Alguém pode alegar que Jesus sofreu porque era necessário, mas que a nossa situação é diferente. Então, examinemos a vida dos discípulos e veremos que nenhum deles conheceu esse "evangelho" da riqueza e plena satisfação pessoal nesta vida. Pelo contrário, Jesus lhes disse: "No mundo tereis aflições, mas tende bom ânimo, eu venci o mundo." (João 16.33). "Quem quiser vir após mim, negue-se a si mesmo, tome sua cruz e siga-me." (Lc.9.23). Ele nunca disse que seus seguidores seriam materialmente ricos. Pelo contrário: "Quem não renuncia a tudo quanto possui não pode ser meu discípulo." (Lc.14.33). O seguidor de Cristo precisa estar disposto a perder tudo o que tem se preciso for e até mesmo ser morto pela causa do Mestre. "Quem perder a sua vida, acha-la-á." (Mt.10.39).
Isso não combina em nada com o "evangelho da prosperidade". Jesus e os discípulos não eram ricos. Quando precisou pagar o imposto, Jesus mandou que Pedro fosse buscar a moeda na boca do peixe (e nem teve troco). O apóstolo Paulo também não conheceu essa "teologia capitalista". Ele sofreu muito e passou por muitas necessidades (II Cor.6.10; 11.24-33). Algumas vezes precisou de auxílio dos irmãos (Fp. 4.10-19).
Essa mensagem materialista tem, em muitos casos, substituído a mensagem de salvação. Fala-se mais em dinheiro do que em pecado e santidade. E muitas vezes os assuntos são entrelaçados, colocando-se o dinheiro sempre em evidência. O dinheiro é importante, precisamos dele e da bênção de Deus nessa área. Contribuir para a obra de Deus é também muito importante. O erro está em colocar a prosperidade material como conseqüência lógica da conversão. Isso não é um ensinamento bíblico.
Deus pode dar e tem dado riqueza material para alguns (I Tm.6.17), mas ele nunca disse que todos os seus filhos seriam ricos. Se a bíblia não tem essa promessa, então não podemos considerar como certa essa conquista. Isso pode fazer parte do plano do Senhor para algumas pessoas, mas não para todas. Lembremos-nos da parábola dos talentos. Aquele senhor deu 500 talentos para cada servo??? Sabemos que não. Ele deu 5 para um, 2 para outro e 1 para o último, mandando que eles trabalhassem até a sua volta. O Senhor distribui bens, oportunidades, recursos e dons de acordo com a capacidade de cada um. O Senhor nos manda trabalhar e adquirir conhecimento e sabedoria (Pv.2). Assim, nossa capacidade pode aumentar e os nossos talentos também. Se queremos prosperar, devemos trabalhar. (Ef.4.28). Deus nos deu 5 talentos. Queremos mais? Devemos trabalhar. Algumas pessoas jamais poderão ser ricas pois não tem condições de administrar um grande patrimônio. Se enriquecessem, poderiam até abandonar o caminho do Senhor. Paulo disse que os que querem ser ricos caem em tentações, laços e concupiscências (I Tm.6.5-11). Entre os tais encontram-se aqueles que usam o evangelho como forma de enriquecimento.


RIQUEZAS ESPIRITUAIS EM CRISTO
Anísio Renato de Andrade

Motivados pela cobiça, muitos cristãos vivem em busca de riquezas materiais e se esquecem das riquezas espirituais que Deus nos oferece através de Jesus Cristo (Tg.2.5). Se alguém puder conciliar as duas coisas e se for este o plano de Deus para a pessoa, excelente. Contudo, o evangelho existe para que as almas humanas sejam salvas. E se a riqueza material for prejudicar ou inviabilizar esse projeto na vida de alguém, então é melhor que essa pessoa seja pobre (Mt. 13.22). Por esta causa é que Jesus mandou que o jovem rico vendesse todas as suas propriedades e desse o dinheiro aos pobres (Lc.18.22). O dinheiro distribuído entre os pobres seria uma bênção e nenhum deles ficaria rico por isso, mas concentrado nas mãos de um só homem, aquela riqueza se tornara um ídolo. Ninguém pode servir a Deus e a Mamom. É melhor entrar pobre no céu do que rico no inferno, conforme se vê em Lucas 16.19-31. Se alguém pode servir a Deus e usar a riqueza como instrumento de justiça, então que faça assim. É um equilíbrio muito difícil e poucas pessoas são capazes de consegui-lo. O que acontece é que muitos estão servindo às riquezas e querendo usar até mesmo o próprio Deus como instrumento para alcançá-las.
O que a bíblia nos ensina a buscar são riquezas espirituais. Se não fosse assim, Jesus nem precisaria ter vindo ao mundo. Em Cristo temos um tesouro de valor inestimável (Col. 2.2-3). Ele quer nos dar: amor, alegria, paz, justiça, sabedoria, fé, fidelidade, integridade, comunhão com o Pai e salvação eterna. Poderíamos fazer uma lista imensa, e mesmo assim incompleta, daquilo que Deus nos oferece. (I Cor.2.9; I Cor.1.30; II Pd.1.4-8; Gál. 5.22). Terminaríamos citando "o que os olhos não viram, os ouvidos não ouviram e nem subiu ao coração do homem." (I Cor.2.9). Precisamos voltar os olhos para os valores espirituais, valores celestiais. Precisamos pensar nas coisas que são de cima (Col. 3.1-5). Precisamos erguer os nossos olhos (João 4.35) e deixar de ficar olhando apenas para o que é terreno, exterior e passageiro. Isso não significa que vamos viver alienados e esquecer da vida material. Precisamos cuidar de todas as nossas responsabilidades terrenas e trabalhar pelos nossos projetos. O que não podemos fazer é tentar colocar o evangelho como instrumento da cobiça nem achar que o cristianismo possa ser garantia de riqueza material.
Se Deus nos der riquezas, isso será uma bênção. Se ele não nos der, estejamos contentes com o que temos. Certamente, não é natural que um filho de Deus viva na miséria, mas isso não significa que todos os filhos de Deus devam ser materialmente ricos. Se temos o "pão nosso de cada dia", já temos motivo para agradecer muito a Deus. Ele se compromete a suprir nossas necessidades. Jesus disse: "Buscai primeiro o reino de Deus e a sua justiça e todas estas coisas vos serão acrescentadas." (Mt. 6.33). Ele não disse "todas as outras coisas", e sim "todas estas coisas". E de que coisas ele estava falando? Do comer, do beber e do vestir, como se lê nos versículos anteriores. Ninguém deveria usar Mateus 6.33 para dizer que Deus vai nos dar empresa, casa na praia e viagem turística pela Europa. Ele pode nos dar isso e muito mais. Porém, isso não é promessa bíblica.
Muitas vezes precisamos passar por situações difíceis para aprendermos lições que, de outra forma, não aprenderíamos. O cristão passa por tribulações, provações, tentações, treinamentos e disciplinas. Podemos passar por dificuldades financeiras e de outros tipos. Isso não combina com uma visão triunfalista de um evangelho ilusório. O certo é que "em todas essas coisas somos mais do que vencedores" (Rm.8). Isso não significa que depois de termos passado por dificuldades financeiras vamos ser ricos. Ser vencedor é cumprir o propósito de Deus e não o nosso. Estamos numa guerra e não em um parque de diversões. E nossa guerra não é para alcançar riquezas, mas é para vencer os poderes de Satanás e ver muitas almas sendo redimidas.
Muitas pessoas recebem uma idéia errada a respeito do evangelho. Com isso criam expectativas ilusórias e acabam se decepcionando.
O Novo Testamento traz uma mensagem que tenta tirar o nosso foco deste mundo e colocá-lo no céu. "Arrependei-vos porque é chegado o reino dos céus". "Não ajunteis tesouros na terra... Ajuntai tesouros no céu." Os primeiros cristãos visavam uma pátria celestial, onde estariam livres de todo o sofrimento terreno. Muitos pregadores da atualidade têm se esquecido de falar sobre céu. Aliás, têm "transferido" o céu para a terra, dando-lhe um sentido materialista, visível, hedonista, egocêntrico e imediato.
Outras considerações avulsas sobre o tema:
  • Jesus veio como o rei pobre – Zc. 9.9
  • Ele disse: "Meu reino não é deste mundo" (João 18.36). E o nosso?
  • A viúva pobre foi elogiada pelo Senhor pela oferta que deu, mas nem por isso ficou rica (Mc.12.44).
  • O reino de Deus não é comida nem bebida mas justiça, paz e alegria no Espírito Santo (Rm. 14.17-18).
  • Vejamos a oração feita por Agur: "Não me dês a pobreza nem a riqueza: mantém-me do pão da minha porção acostumada." Essa pobreza repudiada pelo autor seria no nível da miséria, ao ponto de precisar roubar para sobreviver, conforme se vê na seqüência do texto (Pv.30.8-9).
  • O Novo Testamento menciona que algumas igrejas eram pobres (II Cor. 8.2; Ap.2.9). Ninguém repreendeu aqueles irmãos dizendo que estavam em pecado, debaixo de maldição ou fora do plano de Deus. Aliás, igrejas ricas materialmente deviam ser uma raridade naquele tempo de grandes perseguições contra os cristãos, quando muitos deles perdiam a posse dos seus bens (Heb.10.34). A igreja de Laodicéia era rica materialmente, mas vivia em miséria espiritual (Apc. 3.17-18).
  • Quando Paulo escreveu aos servos ou a respeito deles, não os aconselhou a "abrirem seu próprio negócio". Mandou que eles continuassem servindo fielmente aos seus senhores. (Efésios 6.5-9; Col. 3.22-25; Tito 2.9-10; I Cor. 7.20-24).
  • I Cor. 7.21 – "Se ainda pode ser livre, aproveita a ocasião." Paulo não ensinava aos servos a "teologia da prosperidade" de modo que criasse neles uma expectativa ilusória. Porém ele dizia que os servos deveriam aproveitar as oportunidades, caso pudessem ficar livres. Assim também nós. Não cremos na "teologia da prosperidade", mas se Deus nos quiser abençoar com bênçãos materiais, não perderemos a oportunidade de recebê-las. O que não podemos é ver as bênçãos materiais como conseqüência natural do evangelho. O objetivo de Jesus é salvar almas.
  • Dificilmente entrará um rico no céu (Lc.18.24).
  • Existem muitas promessas de prosperidade material no Velho Testamento (Dt.8.18; 15.4; Salmo 112.1-3; Pv.13.22; 22.4; 24.4; Is.45.3). As promessas da velha aliança eram principalmente de ordem terrena e material. Os cristãos do Novo Testamento não usufruíram dessas promessas assim como não estavam subordinados às exigências do antigo pacto. Aquele compromisso foi com a nação de Israel (não o novo Israel – igreja).
  • A ênfase do Novo Testamento é sobretudo espiritual. Ao utilizarmos os textos do Velho Testamento, podemos talvez interpretar espiritualmente as promessas de riquezas. Não é assim interpretamos tantos textos do Velho Testamento??? Por exemplo, usamos as guerras do VT para falarmos de batalha espiritual. Usamos os bons reis do VT para falarmos sobre Deus e sobre Jesus e os maus reis para falarmos sobre o diabo. Usamos os sacrifícios de animais para falarmos sobre o sacrifício de Cristo, etc.
  • Outro detalhe a se considerar é que a palavra "riqueza" é relativa. Então podemos estar esperando um tipo de riqueza ou uma quantidade diferente daquela que a bíblia menciona.
  • Abraão era rico, muito rico. Alguns o tomam como exemplo para o evangelho da prosperidade. Entretanto, a bíblia não diz se ele enriqueceu antes ou depois de suas experiências com Deus. Talvez sua família já fosse rica.
  • Os cristãos em Atos 4 estavam vendendo suas propriedades e repartindo com os necessitados. Eles não estavam querendo ser ricos nem alimentando essa expectativa em relação ao evangelho.
  • Os cristãos da Judéia passaram por situação material precária e foram ajudados pelos Coríntios e pelos macedônios (II Cor. capítulos 8 e 9; Rm.15.26). Os próprios irmãos macedônios viviam em "profunda pobreza", conforme as palavras de Paulo em II Cor.8.2. Nesse texto, Paulo diz que "Jesus, sendo rico, se fez pobre para que enriquecêsseis". (II Cor. 8, verso 9). Seu objetivo é que enriqueçamos espiritualmente. O texto não está falando de riqueza material pois Jesus nunca foi rico materialmente, nem os discípulos e nem o próprio Paulo que escreveu o versículo.
  • Não estamos fazendo apologia à pobreza. Alguns servos de Deus na bíblia eram muito ricos. Por outro lado, outros eram muito pobres. Precisamos apenas ter uma visão equilibrada a esse respeito. O cristão pode ser rico ou pobre. Ele só não pode ser escravo do diabo.
  • Paulo disse que aprendeu a estar contente com o que tinha. Sabia ter abundância e sabia também padecer necessidade. Por isso ele disse: "tudo posso naquele que me fortalece." (Filipenses 3.12-13).
  • Paulo considerava tudo como "perda" para ganhar a Cristo (Fp.3.7-8). Estamos dispostos a perder alguma coisa por Cristo? Hoje em dia só se fala em ganhar, ganhar, ganhar, ganhar, ganhar.
  • E se Deus quiser que você seja rico??? Então você será. Não é pecado. Mas pense bem: Se Deus quisesse isso, talvez você teria nascido numa família rica. Há exceções... Alguns poucos ficam ricos de outra forma.
  • Para refletir: Depois de tanta propagação da teologia da prosperidade, os cristãos têm ficado ricos? De modo geral, não. Alguns sim, como sempre aconteceu, com teologia ou sem ela, com evangelho ou sem ele. Pouquíssimos, como sempre. Alguns sim, pelo propósito ou pela permissão de Deus. E mesmo se fossem ímpios, talvez ficariam ricos do mesmo jeito. Então, o "evangelho da prosperidade" não tem produzido os efeitos prometidos.
  • Os homens mais ricos do mundo são cristãos praticantes e fiéis? Alguns cristãos ricos já o eram antes da conversão. Seus parentes ímpios também são ricos. Existem também muçulmanos milionários.
  • A bíblia traz muitas advertências sobre os perigos que envolvem as riquezas, principalmente a avareza, que é idolatria (I Cor. 5.11; 6.10; Ef.5.5; Col. 3.5). Outro aspecto que se destaca é a transitoriedade das riquezas (Pv.27.24; Tg.1.9-11). Não se deve colocar nelas a esperança ou a confiança (Salmo 49.6-7; 52.7; 62.10; Pv.11.28; I Tm.6.17). Podem tirar a tranquilidade (Jó 27.19-20; Ec.5.12). Podem ser perdidas repentinamente (Pv.13.11; 23.5; Ec.5.14). Não garantem solução para os maiores problemas do ser humano (Pv.11.4). Luta-se durante uma vida para se enriquecer (Pv.28.22; Ec.4.8). Depois resta pouquíssimo tempo para se usufruir de tantos bens. Bom para os herdeiros, se ainda sobrar alguma coisa para eles e se não forem brigar muito por isso. (Salmo 39.6).
  • Ninguém pode garantir que um dizimista fiel vá ficar rico. Se fosse assim, as igrejas estariam cheias de pessoas milionárias.
  • Há muitos dizimistas pobres e muitos ricos que não são dizimistas. A lógica divina é diferente da nossa.
  • Acima do que fazemos estão os desígnios de Deus para cada um de nós. Algum dos discípulos ficou rico? Será que eles não eram dizimistas fiéis?
  • Em Salmos, Provérbios e Eclesiastes, os autores salientam os benefícios da sabedoria e da justiça, acima dos benefícios da riqueza. O pobre sábio é bem-aventurado. (Salmo 37.16; Pv.3.13-14; 8.11; 16.16; 19.1,22; 22.1; 28.6,11; Ec.4.13; 9.15; Sf.3.12). Salomão conseguiu reunir riqueza e sabedoria (I Rs.10.23), mas essa combinação raramente é encontrada (Ec.9.11).


"O Senhor empobrece e enriquece; abate e também exalta". I Sm.2.7
"Ênfase em prosperidade financeira é materialismo disfarçado de espiritualidade."
Pr. Anísio Renato de Andrade

terça-feira, 12 de novembro de 2013

O PODER DA SEMENTE -

Pr. Anísio Renato de Andrade


No capítulo 13 do evangelho de Mateus, encontram-se algumas parábolas de Jesus. Ele começou falando sobre o semeador. Depois, sobre o joio, o trigo e o grão de mostarda. Em todos os casos, as sementes são as figuras principais e se destacam por serem poderosas.
Na primeira parábola, nota-se o poder da multiplicação, que pode chegar a 100 vezes a quantidade inicial, desde que o terreno seja bom. Na segunda parábola temos sementes boas e más. Na terceira, Jesus afirma que a menor semente produz a maior planta.
As sementes possuem um poder silencioso capaz de reproduzir, multiplicar, perpetuar a espécie e frutificar, produzindo alimento. Elas são, geralmente, pequenas e discretas. Não têm aparência atraente. Não são coloridas nem perfumadas. Por isso, costumam ser desprezadas. Se distribuirmos bons frutos, muitas pessoas aceitarão de bom grado, mas, se oferecermos boas sementes, muitos rejeitarão.
Assim acontece nas nossas vidas. Uma pequena atitude no presente é a semente do futuro. Boas ações, aparentemente insignificantes, são desvalorizadas. Maus procedimentos são subestimados como se não fossem capazes de causar grandes estragos. Ninguém pensa que a cirrose hepática começa com a primeira cervejinha ou que o câncer no pulmão tem ligação com o primeiro cigarro.
Em nossas vidas temos o tempo de semear e o tempo de colher. Os mais jovens estão no tempo da semeadura. Na idade adulta e na velhice, estarão colhendo o que plantaram durante a juventude. Não seja negligente ou omisso, adiando demais as decisões que devem ser tomadas. As sementes precisam ser lançadas no tempo certo.
É muito importante valorizar as sementes que se encontram nas decisões que tomamos. Uma decisão pode mudar o rumo de uma vida ou de várias vidas, inclusive dos filhos, mesmo daqueles que ainda virão. Escolha bem suas sementes. Algumas decisões são muito importantes, como aquelas que dizem respeito aos relacionamentos, aos estudos e à escolha profissional. Quem for leviano na questão do namoro, poderá mudar o rumo de sua história de modo prejudicial.
Para escolher bem as sementes, é preciso conhecê-las. Quem não conhece deve pedir auxílio a quem já passou pela experiência e tem condições de aconselhar. Aqui entra o papel dos pais e dos líderes.
Por quê devemos nos preocupar com a qualidade do que semeamos? Porque sementes lançam raízes profundas e torna-se difícil arrancá-las. Então, uma atitude despretensiosa pode gerar um compromisso permanente. Por exemplo, de um namoro sem propósito pode surgir uma gravidez indesejada. Então, a semente lançou raízes.
Existem situações que, mesmo sendo indevidas no começo, tornam-se válidas de tal modo que nem Deus deseja sua dissolução. No caso da gravidez, a opção existe antes e não depois. O aborto é um crime. A semente não deveria ter sido lançada. Agora, nem Deus quer que a “planta” seja arrancada.
Somos livres para escolher as sementes que vamos semear, mas não para escolher o tipo de fruto na hora de colher. A colheita vem e é obrigatória. A moça que arrumou um namorado no barzinho pode ter depois um marido alcoólatra.
No tempo de colher, o fruto pode ser bom ou mau ou pode não haver fruto para quem não semeou. Então, as pessoas reclamam da sorte, acusam a Deus, culpam os pais, a família, o governo e o destino, mas deveriam lembrar que a maior responsabilidade é do próprio indivíduo. No tempo de colher fica muito difícil alterar a realidade que foi mal plantada. Deus pode mudar histórias e destinos, mas ele nem sempre faz isso. Portanto, precisamos ser cautelosos na hora de semear.
Algumas sementes têm o poder de produzirem inúmeras colheitas. É o caso de certas árvores frutíferas que continuam produzindo após a morte de quem as plantou. Da mesma forma, o mal semeado hoje poderá trazer consequências numerosas e implacáveis, afetando até as gerações futuras.
Palavras também são sementes. Uma palavra muda uma história. Portanto, evite a fala ofensiva e destruidora. O semeador, de Mateus 13, é um pregador que anuncia a palavra de Deus. Receba a divina semente em seu coração. Leia a bíblia e conheça a vontade do Senhor. Ela tem o poder de produzir em nós um caráter que agrada a Deus, representado pelo “fruto do Espírito” que é amor, alegria, paz, longanimidade, benignidade, bondade, fé, mansidão e domínio próprio (Gal.5.22).
Esse fruto é para quem? Em primeiro lugar, para você mesmo. Cada um de nós é o primeiro a usufruir ou sofrer as consequências das sementes que espalhamos nesta vida. Depois, nossos frutos serão também para o benefício daqueles que nos rodeiam. Portanto, por amor a Deus, a si mesmo e ao próximo, semeie somente o bem em todo o tempo.

Pr. Anísio Renato de Andrade
Bacharel em Teologia
anisiorenato@ig.com.br