quarta-feira, 6 de julho de 2016

A ORAÇÃO, SUA EFICÁCIA E SEUS LIMITES




Um dos momentos mais marcantes da infância é quando a criança começa a falar. As primeiras palavras são celebradas pelos pais, mesmo que não sejam pronunciadas com perfeição. A capacidade de se comunicar é o que importa. A partir daí, o vocabulário aumenta rapidamente e chega um dia em que a criança fala até dormindo. Com poucos anos de vida, já é preciso controlar os pequenos falantes: “Não fale de boca cheia”; “Não converse com estranhos”; “Desligue esse telefone”.  Depois de aprender a falar, a criança precisa aprender a evitar determinadas palavras; aprender o modo de falar, a hora certa, o tom de voz e o momento de calar. Bem, são objetivos para a vida toda.

Da mesma forma, os filhos de Deus precisam aprender a falar com o Pai por meio da oração. A bíblia nos mandar orar sem cessar (1Tss.5.17), mas a oração deve ser pautada por uma série de parâmetros que a tornam boa e eficaz. Além de orar, precisamos saber a quem orar, por quem, por quê, para quê, como, quando e onde.

Ore todos os dias. Fale com Deus e não com os ídolos, santos, guias, espíritos, demônios, anjos, fadas ou duendes. A oração bíblica tem um alvo certo: o Pai celestial (Mt.6.9).
Certa vez, os discípulos disseram a Jesus: “Ensina-nos a orar” (Lc.11.1).  Logo, a oração deve ser aprendida. Não me refiro a aprender uma oração que alguém compôs, mas à necessidade de cada pessoa aprender a formular suas próprias orações. Petições erradas são indeferidas. “Pedis e não recebeis porque pedis mal” (Tg.4.3). Aprenda a orar. A oração não pode ser um falatório vão, uma espécie de verborragia inútil.

Antes de falar, o bebê passa meses ouvindo. Quem não ouve não fala. Quem ouve mal fala mal. Nosso trato com a bíblia, a palavra de Deus, definirá a qualidade das nossas orações.
“O que desvia os ouvidos de ouvir a lei, até a sua oração será abominável" (Pv.28:9).

Podemos aprender com tantas preces registradas nas Escrituras, especialmente nos Salmos, mas, além disso, todo o conteúdo bíblico servirá como base das nossas orações, inclusive mostrando o que não devemos dizer perante Deus: murmurações, acusações, votos impensados e “determinações” (como se pudéssemos ordenar a ação divina), etc.

Tudo começa pela motivação correta. Não sejamos como os fariseus, que faziam da oração uma forma de exibição de sua pretensa espiritualidade (Mt.6.5-13). Não seria de se esperar que obtivessem alguma resposta do céu.

Precisamos saber que a oração é um ingrediente, um componente importante em nossa espiritualidade, mas não o único. É como uma engrenagem que, sozinha, não constitui um motor.  Está escrito:

“E se o meu povo, que se chama pelo meu nome, se humilhar, e orar, e buscar a minha face e se converter dos seus maus caminhos, então eu ouvirei dos céus, e perdoarei os seus pecados, e sararei a sua terra” (2Cr.7.14).

A oração é importante, mas não é tudo, assim como um relacionamento é mais do que a comunicação. Devemos observar no versículo citado as seis ocorrências da conjunção aditiva “e” que indica a “soma” dos vários elementos da frase para se chegar a um resultado. O povo de Deus precisa “se humilhar e orar e buscar e se converter”. Temos a tendência de colocar o foco em uma coisa e desprezar as outras, mas, nesse contexto, todas são importantes.
Em alguns momentos, a auto-humilhação tem o seu lugar, por exemplo, quando precisamos reconhecer nossos pecados, confessar e pedir perdão. Sem isso, não avançaremos em nossa espiritualidade. A oração sem humildade é apenas um discurso arrogante e inútil (Lc.18.10-14).

Precisamos orar e buscar a face de Deus. Orar e buscar não são sinônimos. A busca inclui a oração, mas é uma palavra que envolve muito mais, pressupondo necessidade, importância, objetivo, esforço, persistência e a expectativa do encontro (Lc.15.4,8). Existe ainda a intensidade da busca: “Buscar-me-eis e me achareis, quando me buscardes de todo o vosso coração” (Jr.29.13).  Quem busca ora, jejua, levanta pelas madrugadas, renuncia o pecado, lê a bíblia, frequenta os cultos, pede perdão, ora no templo, no monte, em casa, insiste e persiste até obter a resposta.

Orar é imprescindível, mas existem muitas outras coisas que precisamos fazer. Se a oração bastasse, Jesus não diria “Ide e pregai o evangelho a toda criatura” (Mc.16.15).

A oração não é um fim em si mesma, mas visa respostas e resultados mediante as ações divinas em nosso favor. Orações não são palavras mágicas. Sua eficácia não está no uso das palavras corretas (embora devamos evitar as erradas), mas na qualidade do nosso relacionamento com Deus.  É importante falar com o Senhor, mas Caim também falou e nem por isso foi perdoado e salvo. Afinal, ele não pediu perdão. Orou errado (Gn.4.13-14).

A qualidade da oração não está na quantidade, nas repetições, nos gritos, nas palavras bonitas, em se fazer um discurso ou relatório para Deus, trazendo explicações, como se ele precisasse delas.

É importante saber que a eficácia da oração tem limites. A oração do justo pode muito (Tg.5.16), mas não pode tudo. Devemos orar, mas algumas coisas não se resolvem pela oração. Precisamos agir, quando for o caso e estiver ao nosso alcance. Deus não costuma fazer o que é da nossa responsabilidade.

“Então disse o Senhor a Moisés: Por que clamas a mim? Dize aos filhos de Israel que marchem” (Ex.14.15).

A oração em favor de outra pessoa chama-se intercessão, mas não devemos descansar nessa possibilidade como se pudéssemos terceirizar nosso relacionamento com Deus.
Jó demonstrou grande zelo oferecendo ao Senhor o sacrifício em favor dos filhos, mas Satanás veio e os matou (Jó 1.5,18,19). O que deduzimos disso? Os filhos de Jó não eram filhos de Deus e não foram preservados pela intercessão paterna.

Quando a mulher está grávida, ela “come por dois”, como se costuma dizer, mas, depois do nascimento, o filho tem que se alimentar, ainda que seja auxiliado nos primeiros meses. Assim acontece no crescimento espiritual. Eu não posso comer, beber, dormir, respirar ou tomar remédio por você. Assim, todo cristão precisa e deve ler a bíblia, orar, etc.
Jesus orava pelos discípulos (João 17), mas um dia, ele lhes disse: “Vós orareis...” (Mt.6.9). A intercessão de Cristo e do Espírito Santo são fundamentais (Is.53.12; Heb.7.25; Rm.8.26), mas não substituem nossas próprias orações. O advogado fala em defesa do réu, mas a confissão é pessoal (1Jo.2.1; 1Jo.1.9). 

Precisamos saber que algumas orações, por melhores que sejam, podem ser inúteis em virtude da liberdade de escolha que as pessoas têm, por exemplo, no que diz respeito ao casamento e à conversão.
Minha oração pode não evitar o pecado de outra pessoa nem garantirá sua salvação, mas pode ajudar a evitar o meu próprio pecado. Jesus disse que os escândalos viriam. Não adianta orar contra eles. O que posso fazer é cuidar para que eu mesmo não os provoque.

Outra questão importante é lembrar que o plano de Deus é superior. Jesus orou, dizendo:

“Meu Pai, se possível, afasta de mim este cálice; todavia, não seja como eu quero, mas como tu queres” (Mt.26.39).

O cálice não foi afastado. Jesus mostrou que podemos apresentar nossas angústias e desejos ao Pai. Você não está impedido de pedir o que quiser, mas não significa que será sempre atendido.
Os propósitos de Deus não podem ser impedidos, a não ser naqueles casos em que ele mesmo deixou a possibilidade de mudança pelo arrependimento, como ocorreu em Nínive.
Nenhuma oração impedirá o Apocalipse, nem converterá o diabo nem mudará o passado. Depois do adultério com Bateseba, Davi orou muito para que o filho não morresse, mas a consequência do pecado não seria aplacada pela oração. Deus não está limitado neste assunto, mas os efeitos dos nossos erros geralmente permanecem.

Portanto, vigie para que o mal não aconteça, quando for de sua competência evitá-lo. A oração não impedirá que colhamos o que foi semeado.
A vigilância é um importante complemento da oração. A falta de vigilância inutiliza as melhores armas.

Muitas orações são rejeitadas por Deus, quando associadas à desobediência (Pv.28:9). A oração do justo é eficaz (Tg.5.16), mas o pecado bloqueia a comunicação com Deus, que somente será recuperada mediante a confissão e o pedido de perdão. Não é assim também entre os homens, quando uma ofensa os separa?

Se alguém não quer se reconciliar com Deus, sua oração torna-se pecado (Salmo 109.7).

“Por isso, quando estendeis as vossas mãos, escondo de vós os meus olhos; e ainda que multipliqueis as vossas orações, não as ouvirei, porque as vossas mãos estão cheias de sangue. Lavai-vos, purificai-vos, tirai a maldade de vossos atos de diante dos meus olhos; cessai de fazer o mal” (Is.1.15-16).

Em situações assim, até a intercessão pode ser rejeitada. É o caso da oração proibida:

“Jeremias, não ore por este povo nem faça súplicas ou pedidos em favor dele, nem interceda por ele junto a mim, pois eu não o ouvirei” (Jr.7.16).

“Se alguém vir pecar seu irmão, pecado que não é para morte, orará, e Deus dará a vida àqueles que não pecarem para morte. Há pecado para morte, e por esse não digo que ore” (1João 5.16).

O propósito deste estudo não é nos tirar a motivação para orar, mas, ao contrário, nos estimular a uma vida de oração intensa, correta e eficaz.

“E esta é a confiança que temos nele, que, se pedirmos alguma coisa, segundo a sua vontade, ele nos ouve. E, se sabemos que nos ouve em tudo o que pedimos, sabemos que alcançamos as petições que lhe fizemos” (1 João 5.14-15).


Pr. Anísio Renato de Andrade

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