quarta-feira, 5 de agosto de 2015

O MINISTÉRIO PROFÉTICO





No jardim do Éden, Deus falava diretamente com Adão e Eva (Gn.2 e 3). O pecado deu início a um processo de afastamento entre o homem e Deus. Ele falou também com Caim, antes e depois da morte de Abel (Gn.4).  (Se Caim estivesse aqui hoje, talvez seria muito valorizado, pois Deus falou com ele).  Dali em diante, a comunicação de Deus com os homens foi se tornando cada vez mais distante, indireta e rara. A humanidade se multiplicou, mas o Senhor falava com poucas pessoas, como Noé, Abraão, Isaque e Jacó. 
Em muitas situações, ao invés de falar com as pessoas, Deus lhes enviava um anjo, como aconteceu com Abraão e Ló: comunicação indireta.
Depois, tornaram-se frequentes as mensagens através de sonhos.  A bíblia não diz que José do Egito ouviu a voz de Deus alguma vez, mas a mensagem lhe chegou através de sonhos (Gn.37). Da mesma forma Deus se comunicou com Abimeleque (Gn.20.6), com Faraó (Gn.41)  e seus servos:  o copeiro e o padeiro (Gn.40).
Nesse contexto da comunicação indireta de Deus com o homem é que surge a necessidade do ministério profético como um porta-voz.  O primeiro profeta “registrado” na bíblia foi Enoque (Jd.14). O segundo foi Abraão (Gn.20.7).  Deus declarou que ele era profeta. Não foi uma auto-proclamação, mas uma vocação divina.
O terceiro profeta declarado pela bíblia é Moisés (Dt.34.10). Nessa época, os profetas eram raros.
A lei de Moisés definiu em detalhes o funcionamento do ministério dos levitas e sacerdotes (Num.3; Num.4; Ex.28), mas não fez o mesmo com o ministério profético. Por isso, dizemos que o profeta é um ministério não regulamentado, “fora do script”.  A lei não determinava sua linhagem, idade,  atividades, roupas ou rituais.  O profeta não dependia de vínculo genealógico, eleição ou direito adquirido. Sua manifestação dependia inteiramente de Deus. Por isso, encontramos até um profeta gentio no antigo testamento: Balaão.
Levitas e sacerdotes estavam em constante atividade em Israel, podendo ser encontrados em determinados lugares e horários. Os profetas eram incertos.  Em determinadas épocas, não havia profeta em atividade.  O profeta era “previsto em lei”, porém imprevisível, pois ninguém sabia quem ele seria, nem quando ou onde apareceria.  Como disse um aluno: o profeta era “uma carta na manga de Deus” para certas situações.  
A respeito dos profetas, Moisés só determinou uma coisa: a sentença de morte para aqueles cujas profecias não se cumprissem (Dt.13.1-5; 18.20). Embora este mandamento não esteja em vigor hoje, temos nele um forte ensinamento sobre a seriedade da profecia.  Não podemos falar em nome de Deus sem que ele nos tenha mandado. Não podemos matar os falsos profetas, mas nada impede que Deus lhes mate.
O profeta existe para o tempo da crise. Nos momentos de maior degradação pecaminosa em Israel, eles se manifestavam. Por isso, sua aparição não era bem vista. Via de regra, o profeta é um sinal de que as coisas não estão bem.  Eles não vinham para elogiar ou agradar, mas para  repreender. Por isso, não eram queridos, amados, honrados, exaltados ou premiados.  Eram temidos (ISm.16.4), rejeitados, desprezados, odiados, perseguidos e mortos (Mt.5.12; 23.29-35). Por esta causa, alguns vocacionados não queriam ser profetas (Jr.1.5-6; Am.7.14).
Quem fica feliz com a chegada do cobrador, do interventor ou do oficial de justiça? Ninguém. Assim também ocorria com a chegada do mensageiro de Deus.  Os profetas do Antigo Testamento tinham a missão de cobrar o cumprimento da lei de Moisés.
Eles incomodavam muita gente. A autoridade que Deus lhes conferia era tanta que repreendiam até os reis. Natã repreendeu Davi. Elias repreendeu Acabe. Muito tempo depois, João Batista repreendeu Herodes.  Se fosse hoje, as pessoas lhes diriam: “Você está me julgando”, mas a palavra do profeta não é julgamento, senão um aviso para que a pessoa não seja condenada por Deus.
Depois da morte de Moisés, o povo de Israel viveu um período de poucas profecias.  Nos dias do sacerdote Eli, a palavra do Senhor era muito rara (ISm.3.1). Então, foi  levantado o profeta Samuel. Naquele tempo começava um movimento chamado “profetismo”.  Surgiram escolas de profetas e esse ministério floresceu em Israel, como sinal de que as coisas não iam bem.
Vieram Natã, Gade, Elias, Eliseu e muitos outros.  Surgiu então, no contexto da monarquia, a figura do profeta profissional, um funcionário da corte que recebia salário para profetizar o que o rei queria ouvir. Por exemplo, os ministros de Estado têm sempre uma palavra otimista em relação à economia, mas os analistas independentes falam a verdade claramente. Assim acontecia no caso dos profetas. Elias, por exemplo, era bem diferente dos profetas de Baal, que viviam para agradar Jezabel.  Assim, enquanto centenas de falsos profetas viviam nos palácios, alguns verdadeiros se escondiam nas cavernas.  Uma exceção interessante foi Daniel: um profeta verdadeiro no palácio. Ele era um político honesto.
Além de falar a mensagem de Deus, alguns profetas escreveram seus oráculos.  Algumas vezes, Deus mandou que escrevessem (Ex.17.14; 34.27; Is.8.1; Jr.30.2; Hab.2.2; Ap.1.11). De outro modo, suas palavras não chegariam a nós. Vemos, portanto, como é importante escrever a mensagem que temos a transmitir, pois nós passaremos, mas ela continuará alcançando vidas. Escrever a profecia era também um ato de ousadia e coragem, pois ficaria muito mais fácil conferir seu cumprimento e até condenar o profeta à morte se a sua palavra fosse mentirosa.
O ministério profético não ficou restrito ao Antigo Testamento.  Depois de um longo período sem profecias, aproximadamente 400 anos, apareceu  o profeta  João Batista. A surpresa foi tão grande que toda a população de Jerusalém queria vê-lo e ouvi-lo (Mt.3).  Embora fosse da família sacerdotal, João Batista assumiu aquele ministério “fora do script”. Sua roupa era feita de pelos de camelo, que nem de longe lembrava o linho das túnicas sagradas (Mc.1.6). Ao invés de comer os pães da proposição, comia gafanhotos e mel silvestre.  Era uma figura chocante, talvez até ofensiva, pois, de acordo com a lei,  o camelo era um animal imundo.  Sua mensagem também não era agradável, pois chamava o povo à confissão de pecados e ao arrependimento.
Depois, veio Jesus, que era também profeta (João 4.44). No Novo Testamento temos ainda: a profetisa Ana (Lc.2.36),  o profeta Ágabo (At.21.10),  alguns anônimos (At.13.1) e, finalmente, João, com a profecia do Apocalipse.
Paulo disse que Deus colocou na igreja: Apóstolos, profetas, evangelistas, pastores e mestres (Ef.4.11).  Não há razão para supormos que o ministério profético tenha acabado.  Ele continua em nossos dias, trazendo a mensagem de Deus, repreendendo os pecadores e anunciando os propósitos do Senhor.
Profeta não é sinônimo de pregador. Alguém só pode profetizar o que Deus lhe falou. Repetir o que a bíblia diz não é profetizar.  Falar o que eu quero que aconteça na vida de alguém não é profetizar. 
Como dissemos, a comunicação de Deus com o homem tornou-se muito indireta. Por exemplo: Deus falou com o anjo, que falou com Daniel, que escreveu a profecia, que hoje eu leio pra você ouvir.  Que comunicação mais indireta! É válido ouvir a mensagem de Deus assim, mas  precisamos de uma comunhão mais próxima com o Senhor.
O pecado de Adão iniciou um processo de afastamento entre o homem e Deus. A obra de Cristo tem o propósito de nos levar no sentido inverso, aproximando-nos do Pai.  Por isso, Tiago escreveu: “Chegai-vos a Deus e ele se chegará a vós” (Tg.4).
Qual é o caminho? A busca da intimidade com Deus.  Abraão foi chamado profeta porque era amigo de Deus (Is.41.8; Tg.2.23; Gn.18.17).  Contamos nossos segredos a qualquer pessoa? Não, mas apenas aos amigos íntimos. Deus também faz assim (Am.3.7; Sal.25.14).
Precisamos buscar a intimidade com Deus. Jesus disse que os fariseus gostavam de orar nas ruas, praças e sinagogas. Então, ele ensinou os discípulos a orarem onde só Deus pudesse vê-los (Mt.6). Esta é uma forma de buscar intimidade com Deus. Este é o caminho do ministério profético.
O apóstolo João era o discípulo mais próximo de Jesus.  Até no momento da crucificação, lá estava ele. Resultado: recebeu as maiores revelações registradas na bíblia, o Apocalipse.
Busquemos ao Senhor, pois ele quer nos usar como profetas nesta geração.


Pr. Anísio Renato de Andrade.

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